domingo, 3 de julho de 2011

Programa REVIVE - Rede de Vigilância de Vectores - 2011

As alterações climáticas têm representado uma das maiores ameaças ambientais, sociais e económicas que temos enfrentado actualmente.

Estas alterações, responsáveis pelo aumento da frequência e intensidade de temperaturas extremas adversas bem como a ocorrência de eventos climáticos extremos (cheias e secas), constituem um grave risco para a saúde pública humana, quer pelo aumento de doenças associadas à água, aos alimentos e poluição do ar, quer pelo aumento de doenças transmitidas por vectores, que é o tema que pretendo explorar de seguida.

As doenças transmitidas por vectores são doenças infecciosas transmitidas aos seres humanos e a outros vertebrados, por vectores como mosquitos e carraças, infectados por agentes patogénicos. Estas doenças apresentam frequentemente padrões sazonais distintos o que permite estabelecer uma associação ao clima.

Uma vez que o número de agentes etiológicos transmitidos por vectores, assim como a sua área de distribuição e incidência na Europa tem vindo a aumentar nos últimos anos, revela-se fundamental identificar e determinar a sua prevalência para se determinar a potencial incidência destas doenças. Por outro lado, a transmissão destas doenças é influenciada pela presença de reservatórios adequados e também pela existência de populações de vectores e agentes patogénicos em número suficiente para manter a transmissão. A transmissão aos seres humanos exige que exista um contacto com o vector infectado com o parasita, sendo esta exposição influenciada por uma diversidade de factores, respectivamente o comportamento humano, condições sócio‐económicas, práticas de gestão ambiental e cuidados de saúde primários.
 Para fazer frente a esta situação a tónica incide mais uma vez na prevenção, pois a vigilância de vectores permitir-nos-á detectar atempadamente qualquer alteração na abundância e na diversidade, facilitando a tomada de decisão por parte das autoridades de saúde no sentido de serem adoptadas estratégias que contribuam para o controlo das populações de vectores eliminando ou reduzindo o impacto na saúde pública.

De modo a instigar estas acções, foi celebrado um protocolo entre as Administrações Regionais de Saúde (ARS), Direcção-Geral da Saúde (DGS) e Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge (INSA) / Centro de Estudos de Vectores de Doenças Infecciosas (CEVDI), que desenvolveu a Rede de Vigilância de Vectores – REVIVE, com o intuito de identificar quais as espécies de vectores existentes em Portugal, a sua localização geográfica e a caracterização do seu papel enquanto vector de agentes de doença.  O REVIVE iniciou-se com a vigilância de culicídeos (mosquitos e larvas) em 2008, a nível nacional, sendo em 2011 alargado à vigilância de ixodídeos (carraças).

Desde 2008 já foram identificados aproximadamente 78 mil mosquitos em 44 concelhos, não tendo sido encontradas espécies invasoras ou vírus que provoquem doenças ao homem. Contudo, na Madeira, o vector do dengue foi identificado há alguns anos, revelando-se um mosquito resistente aos insecticidas o que tem dificultado a sua erradicação. Há que enfatizar que embora a presença deste mosquito seja motivo para reforçar a vigilância deste vector, o grande risco associado à sua presença prende-se com o facto do mesmo poder ser portador do virus (Dengue).

Na realidade, não podemos deixar de ter em consideração que o clima em Portugal tem sofrido algumas alterações, caracterizando-se cada vez mais por um clima tropical, o que favorece a presença e proliferação dos mosquitos devido ao calor e humidade. Por estes motivos a vigilância de qualquer alteração no número de espécies revela-se fundamental no sentido de reforçar o controlo e a prevenção.


De uma forma geral, o programa REVIVE será implementado entre Maio e Outubro, apresentando como objectivos:
- Vigilância da actividade de artrópodes hematófagos, caracterização das espécies e da ocorrência sazonal nos locais previamente seleccionados;
- Identificação de agentes patogénicos importantes em saúde pública transmitidos por estes vectores;
- Emissão de alertas no sentido de adequar medidas de controlo, em função da densidade dos vectores e do nível de infecção.

A Unidade de Saúde Pública onde me encontro a estagiar, colabora no desenvolvimento deste programa realizando a:

- Identificação e selecção de locais de colheita em função de zonas consideradas de maior risco;
- Realização da colheita dos vectores (mosquitos adultos e imaturos; carraças);
- Expedição das colheitas efectuadas para o INSA/CEVDI;   


Culicídeos (mosquitos)

Actualmente, conhecem-se cerca de 3500 espécies de sub-espécies de culicídeos (mosquitos) no mundo. As doenças transmitidas por insectos já constituíram graves problemas de saúde pública na Europa, respectivamente a malária, dengue e febre-amarela, que embora tenham sido erradicadas na Europa em meados do século XX, continuam a existir espécies de mosquitos responsáveis pela transmissão destas patologias. Actualmente, na Europa, são conhecidas encefalites virais transmitidas por mosquitos.  Um aspecto importante a ter conta é que apenas as fêmeas têm o aparelho bucal adaptado à sucção de sangue, devendo estas ser alvo de preocupação, pois mais facilmente se tornam vectores de agentes patogénicos.
   

Actividades a desenvolver até Outubro de 2011: 
 
A captura de mosquitos abrange as diferentes fases do seu ciclo de vida, como pode ser verificado na figura em baixo. 

ciclo-vida-mosquito

Actividade 1: recolha de mosquitos imaturos –  larvas 

- Com recurso a um camaroeiro realizámos a colecta de larvas, as quais fomos transferindo para um recipiente com água do ponto de amostragem;
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- Após capturarmos o maior número possível de larvas, preenchemos o boletim de colheita. Numa fase posterior,  realizámos a  transfega das larvas para recipentes adequados.

Actividade 2: recolha de mosquitos adultos

- A captura de mosquitos adultos foi realizada através da armadilha CDC light-trap e gelo seco (CO2). Estas armadilhas possuem uma fonte de luz que atrai os insectos para uma zona de onde são automaticamente aspirados para o saco colector. O gelo seco representa um atractivo para os mosquitos, uma vez que estes insectos localizam os potenciais hospedeiros através do dióxido de carbono expirado.
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 Gelo seco + CDC light-trap

- A armadilha foi colocada num local estratégico, junto de um lago, abrigado do vento a uma distância  de 1,50 m do solo.

- Na manhã seguinte recolhemos o recipiente colector, evitando a fuga de insectos.
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- As armadilhas devem ser colocadas ao entardecer, sendo o saco colector recolhido ao amanhecer do dia seguinte, uma vez que actividade diária dos mosquitos é condicionada pela temperatura e humidade relativa do ambiente, esta actividade restringe-se portanto ao período nocturno, quando a temperatura diminui e a humidade aumenta.

- Uma vez realizada a colheita, preenchemos o boletim respectivo.
- Até à expedição, os mosquitos imaturos e adultos, foram mantidos em condições de refrigeração.

Ixodídeos (carraças)
Os ixodídeos, vulgarmente designados por carraças, existem em quase todas as regiões zoogeográficas, parasitando uma ampla variedade de hospedeiros como mamíferos, aves, répteis e anfíbios. As carraças alimentam-se do sangue do hospedeiro, geralmente de animais domésticos, silvestres e ocasionalmente o Homem. Cada espécie pode transmitir diversos agentes infecciosos que causam doença no Homem, nomeadamente a borreliose de Lyme e a febre escaro-nodular (febre da carraça), que em Portugal é a doença de notificação obrigatória desde 1950.

 Ciclo de vida da carraça




Actividade 3: recolha de ixodídeos (carraças) 
Técnica: Flagging  
- Passamos o pano turco, de cor branca sob a vegetação, a uma velocidade constante de 5 em 5 passos;
IMGP0012


- As carraças capturadas foram colocadas num tubo rolhado, com algumas erva no interior por forma a manter a humidade no interior;

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IMGP0020
 

- Uma vez realizada a colheita, preenchemos o boletim respectivo;

- Até à expedição, as carraças foram mantidas em condições de refrigeração.

NOTA: Em todas as colheitas realizadas, referentes às actividades 1, 2, 3, registámos a temperatura e a humidade através do termómetro e higrómetro. No caso dos mosquitos adultos, uma vez que a captura se processa em dois momentos diferentes, as medições são realizadas ao entardecer e depois ao amanhecer.

IMGP0004
Termómetro + Higrómetro


Expedição das amostras
 
As amostras (mosquitos imaturos, mosquitos adultos e carraças) devem ser acondicionadas em caixas de esferovite com termoacumuladores e papel kraft, de forma a ser mantida a refrigeração até ao destino, devendo ser enviadas quinzenalmente por correio azul, juntamente com os boletins de colheita para o Centro de Estudos de Vectores e Doenças Infecciosas Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge.

 
Curiosidades:

Doença
Vectores responsáveis pela transmissão
Realidade em Portugal
Malária  Anopheles atroparvus
 
Anopheles atroparvus -02
‐ Doença endémica no passado;

‐ Existem actualmente casos de malária importados;
Febre do Nilo Ocidental  Aedes albopictus 

aedes_albopictus


Culex
culex
‐ Vectores responsáveis pela transmissão são abundantes e estão amplamente distribuídos;
Dengue/
Febre amarela /
Febre Chikungunya
Aedes aegypti  

aedes_aegypti

Aedes albopictus
‐ Febre amarela endémica no passado;


‐ Actualmente não existem casos endémicos;

‐ Não existe informação disponível sobre casos importados;
Flebótomos
Leishmaniasis
Mosquito flebotomíneo

leishmaniose_fer
‐ Doença endémica com casos reportados anualmente;

‐ Existem cães infectados (hospedeiros);
Carraças
Borreliose de Lyme Ixodes scapularis

- Não se conhece a
verdadeira prevalência da doença, que continua a ser sub-diagnosticada;    

- É reconhecida a presença do vector no país; 
Febre escaronodular Rhipicephalus sanguineus






Rhipicephalus sanguineus
‐ Doença endémica com casos reportados anualmente;

  ‐ Existem cães infectados (hospedeiros);




  


 Para descontrair...

 

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